Depois que meditação virou um prazer
Existe uma simpatia que coloca um passarinho pra piar na boca da criança pra ela falar… Eu acho que colocaram um passarinho na minha cabeça! É uma falação tão bagunçada o tempo todo, que até pra dormir é difícil. Ou melhor, era.
Eu achava muito xique-bacanizado quem sentava pra meditar e passava mais de 10 minutos ali, quietinho. Meu, como ela consegue? Eu não consigo! Não adianta! Quando eu sento e fecho os olhos, parece que estou tentando dormir numa arquibancada na final do campeonato.
A essa altura, eu já perdi as contas de há quantos anos eu pratico meditação. O que sei é que, hoje, depois de muitos livros, palestras e (muuuitas) tentativas, meditar é um hábito, tão necessário e tão gostoso quanto comer. E eis aqui as que mais me ajudaram a conviver o tal passarinho.
Prática 24/7
Esse é o passo mais importante de todo o processo e sem o qual não foi possível seguir em frente. Eu não vou me aprofundar muito nele porque já escrevi sobre (quem quiser ler: Meditação não vai te ajudar a concentrar melhor).
Mas é tão importante que vale a pena relembrar: a gente é bom naquilo que pratica.
Se pratico agitação e multitarefa o dia inteiro, todos os dias, eu não vou conseguir algo diferente quando meditar. Minha mente vai estar tão acostumada a fazer mil coisas ao mesmo tempo, que vai procurar outras coisas enquanto eu estiver sentado meditando (ou tentando meditar).
Menos é mais! Menos coisas, menos tenho-que, menos, menos, menos.
Corpo + mente
Pode parecer bobagem, mas corrigir a postura corporal é, em si, um treino de atenção constante. Além disso, alinhar o corpo com a mente é uma combinação poderosa. Os especialistas falam isso o tempo todo, ainda mais com o home-office em alta.
✓ Cabeça erguida
✓ Coluna ereta
✓ Peito aberto (ombros para trás e relaxados)
Pra quê?
Foi e é sempre muito importante ter bem claro um objetivo na meditação. Não tem exatamente um certo-e-errado nessa questão, mas é preciso saber o motivo de estar meditando. Pra quê? Qual é o objetivo?
Importante: a meditação não é o objetivo, é uma consequência (de uma prática constante e diária). Dentro desta consequência, quais são os seus objetivos?
Eu gosto muito de uma definição que li num livro (e peço desculpas por não saber qual deles):
Orar é pedir ajuda. Meditar é ouvir a resposta.
Eu sento, me visto com a energia que quero vibrar e me acostumo com ela. Procuro ensinar meu corpo a vibrar naquela vibe. É como adestrar um cão.
Por exemplo: se quero ser valorizado, eu conduzo minha atenção para a sensação de ser valorizado, e mantenho essa energia dentro de mim.
Assistindo a vida na beira da estrada
Já faz tempo que eu falo isso, e vou continuar repetindo: meditar é como sentar-se à beira de uma estrada e assistir o ir e vir do trânsito. Os pensamentos são os carros, e não há a menor necessidade de controlar nem de subir em algum deles. Sou espectador, não controlador.
No começo, eu achava que meditar era não ter nenhum carro na estrada. E o problema era justamente esse, era a minha maior dificuldade, (porque) sempre tem carros!
Com a prática do menos-é-mais (citada no outro texto), o número de carros diminuiu drasticamente, e facilitou tanto a prática da meditação que eu passei a entrar no fluxo até estando de olhos abertos e em pé.
Eu não preciso de silêncio para meditar -quem disse que preciso?-, eu posso abraçar os barulhos ao meu redor, e meditar apesar deles. Não é mais condicional. Não estou preso às circunstâncias exteriores e terceiros.
Com carro ou sem carro, com barulho ou sem barulho, o assistir é o mesmo.
Escondido nas escrituras sagradas
Sim, é mais fácil meditar quando tudo está quieto (ao redor e também dentro de nós), mas com o tempo, acabei descobrindo que eu não sou o trânsito, nem sou o espectador na beira da estrada. Se eu posso perceber o espectador, eu sou algo além.
Quem viu Kung fu panda sabe que o segredo é que não há segredo. Não porque o pergaminho em branco é um “nada”, mas porque o pergaminho em branco pode ser tudo! Ele tem todas as possibilidades, pode ser qualquer coisa!
Isso me lembra de três coisas interessantes na Bíblia:
Lech Lechá
Quando Deus convida Abrão, o termo usado no texto original é “lech lechá”, que significa “vai para ti mesmo”. “Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai” quer dizer “sai das definições que você mesmo, teus pais e a sociedade colocam em ti”, saia das limitações. Vá além!
Ir além dessa superficialidade, da identidade, do palpável. Além dos carros e do espectador, além dos pensamentos e das ideias que temos sobre nós mesmos. Essas coisas são mutáveis, a nossa essência não.
Desapego
Jesus e seus discípulos falavam constantemente sobre se desfazer de coisas materiais, sobre não ter nada, etc. Falavam também sobre deixar de ser quem é, e tal. Muito mais do que uma renúncia ou um voto de pobreza, era uma maneira de dizer “menos é mais”, “lech lechá”, “esvazie-se, perca a forma”.
Tenha menos coisas, menos sapatos, menos roupas, menos bonés, menos contas em redes sociais, menos atividades e obrigações sociais… dedique sua energia vital com o que realmente importa.
Quais são as coisas que te aproximam da sua essência?
Seja menos os padrões e definições que você, sua família e a sociedade impuseram sobre você, e seja mais a sua essência. Deixa a essência crescer, a parte eterna e imutável do seu ser.
Gênesis
Por fim, uma coisa que passou despercebido por mim até esses dias: “no início, a terra era vazia e sem forma”.
Quando a gente nasce, somos vazios e sem forma (na mente). Com o passar dos anos, vamos acumulando ideias, momentos, sentimentos e coisas, e nos conformamos com elas. Conformar significa “dar forma”.
A pergunta é:
se você pudesse se teletransportar para algum lugar qualquer, qual seriam as coisas necessárias para te recriar?
Seu corpo? Suas roupas? Suas ideias? Suas emoções?
Quem é você? Qual é a coisa sem a qual você não é você?
O que você quer/busca é o que você realmente quer, ou é o que as pessoas querem que você queira/busque?
Você tem vivido pela sua essência ou pelas coisas externas?
Respostas que só podem ser encontradas por você. Não em um texto, nem num livro, muito menos numa religião. A resposta está em você. E, talvez, a resposta seja você.
💛
Eu sou Gui Melo. Seu escritor favorito!